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"O Pacto "
Antônio levantou sem fazer barulho, não queria acordar Olívia. Aproximou e lhe deu um beijo, dizendo baixinho _ se eu não voltar, virei te avisar Ao que ela sempre respondia _se você não voltar, irei te encontrar Esticou a mão para tocá-lo mas ele já havia saído O sol começava a despontar anunciando um belo dia Antes de sair Antônio revisou o barco junto com seu velho companheiro e amigo de trabalho. Tudo pronto, partiram Olívia só levantou bem depois, não tinha pressa, Antônio só voltaria a tarde. Havia um pacto entre eles desde que se conheceram, que um não viveria sem o outro, e que quando um morresse o outro de alguma forma saberia. As pessoas não gostavam de ouvir sobre isso, achavam que era bobagem, e que só queriam chamar a atenção. Por algum motivo, Antônio e Olívia acreditavam nisso. Depois de tantos anos juntos, eles não se viam separados, eram almas gêmeas, um amor, um companheirismo que durava décadas. Não tiveram filhos, mas compensava a falta ajudando a cuidar dos filhos de outros pescadores . Antônio ia atento, buscava o melhor lugar para jogar a rede, por isso avançava mais e mais Avistou um grande cardume e lançou a âncora. Preparou o equipamento de pesca e notou que o vento mudava de direção. O barco começou a balançar, o céu escureceu tão rápido que ele se assustou. Não dava para continuar alí, precisavam voltar. A muito custo recolheu a rede e a âncora, seu amigo tentava manobrar o barco, mas ondas imensas surgiam na sua frente, fazendo com que ele perdesse o controle. Antônio se debateu no convés, ao mesmo tempo que gritava por seu amigo. As ondas chegavam cada vez maiores e ao tentar chegar até a cabine, uma nova onda sacudiu o barco jogando ele por sobre a grade de proteção. Sentiu o impacto ao cair na água, aquele era seu fim e ele sabia, seu amigo preso na cabine, o mar revolto, não tinha como escapar. Afundou, e quando emergiu, o barco era apenas uma mancha, tentou nadar, mas as ondas o empurravam para mais longe. Pensou em Olívia, o quanto ele a amava, o tanto que haviam sido felizes, ela esperava por ele. Sentindo as forças lhe abandonarem, fechou os olhos e rezou. As horas foram passando e Olívia se inquietando, a noite chegou e Antônio ainda não tinha voltado. O vento soprava forte e sem ter como ir até a praia ela se desesperou. _Na melhor das hipóteses ele está bem e esperando a tempestade passar Na incerteza do que tinha acontecido começou a falar sozinha. Adentrou a noite e nada, Olívia pendurou lampiões na varanda como era costume dos moradores em noites como aquela. Andando de um lado pro outro, tentava manter a calma, mas sentia uma agonia sem fim, e assim foi a noite toda. Quando o dia amanheceu não havia uma nuvem sequer no céu, era como se nada houvesse acontecido. Caminhou até a praia e esperou. Perdeu a noção do tempo, até que alguém a trouxe de volta a realidade, ele não ia voltar, pelo rádio ouviram a notícia dos destroços do barco, e vários pescadores saíram em busca. Sentiu que ia desfalecer, tudo a sua volta escureceu, e cega de dor correu mar adentro, foi contida por algumas pessoas e levada de volta pra casa. Não, ela se recusava a acreditar que Antônio não ia voltar, depois de um tempo, respirou fundo e se acalmou, parecia anestesiada. Um por um, todos foram se retirando, ficariam por perto se precisasse. Olívia enxugou as lágrimas, nada do que disseram era verdade, Antônio estava bem e seguro em algum lugar, ele voltaria. A noite chegou e com ela a notícia de que nenhum corpo foi encontrado, vivo ou morto. Olívia ignorava tudo que lhe diziam, e começou uma espera angustiante. Todos os dias ela ia a praia pela manhã, perambulava de um lado pro outro, sempre esperando Passou a não se cuidar, falava sozinha, e quando tentavam algum contato, ela repudiava. Nessa situação o tempo foi passando, seus cabelos branquearam e seus olhos perderam o brilho, em nada lembrava aquela mulher de outrora. Sozinha, sem aquele que foi seu grande amor, sua alma gêmea, Olívia ia enlouquecendo aos poucos, andava suja e maltrapilha. Todos lhe respeitavam, as vezes deixavam frutas e comida em sua varanda, mas quase sempre elas permaneciam lá. Olívia definhava a olhos vistos e todos se comoviam com sua situação. Um dia estranharam o fato de vê-la com uma roupa limpa e o cabelo arrumado, quando questionada simplesmente dizia que Antônio estava chegando. Nesse dia ela não foi a praia, e se sentou na varanda para espera-lo. De onde estava podia ver os barcos que chegava. Notou que o céu tingiu-se de cinza, e depois escureceu, mas nada a incomodou, seu pensamento estava em Antônio, ele já deveria estar chegando. Quando começou a cair os primeiros pingos d'água ela o viu vindo em sua direção. Estava tão absorta que não o viu o barco atracar , e de mais a mais, o importante era que ele estava alí Entrou correndo em casa, serviu-lhe uma caneca de café e o abraçou satisfeita. No dia seguinte quando os vizinhos passaram por sua casa perceberam o lampião ainda aceso na varanda, resolveram ir ver e a encontraram morta sentada a mesa do café, em seu rosto ainda podia ver um leve sorriso...
Maureen
Enviado por Maureen em 04/12/2024
Alterado em 05/12/2024 Comentários
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